sábado, 27 de outubro de 2012

A Medida das coisas


Fui a um casamento lindo. A noiva estava deslumbrante, radiante e lindíssima. Festa, música, dança. Muita alegria e também tristeza. O pai do noivo, que ficara doente há poucos meses, depois de altos e baixos durante seu tratamento, faleceu há exatas duas semanas dessa data tão especial e aguardada. Que complicado!

Casamento planejado, elaborado, pago, agendado. Tão ansiosamente esperado. Convites entregues, presentes recebidos.

Ainda no hospital, o pai do noivo, que era uma pessoa boníssima e querida por todos, opinou que se mantivesse a data, obviamente não imaginando que não estaria presente. Porém, aqueles que bem o conheciam acreditam que ele, mesmo depois de sua morte, não gostaria de ver a festa canelada.
Discutiu-se entre os familiares o cancelamento do evento e sua substituição por algo bem mais simples em outro dia.

Pelo que sei, ao ouvir até então apenas um lado da história, os noivos optaram pela manutenção da data. Alguns dizem que o noivo foi fraco em submeter-se à vontade da noiva (a malvada), responsabilizando-a pela festa num momento tão delicado. Mas acredito que a difícil decisão deva ter sido tomada em conjunto.

Alguns parentes da viúva não vieram de longe por não encontrarem motivos para festejos e alguns parentes do pai falecido vieram de outro país para prestigiar a família num momento tão peculiar, nesse misto de tristeza e alegria e desejar felicidades aos noivos.

Profundamente desgostosa, infeliz e intensamente contrariada, a mãe do noivo viu-se obrigada a fazer seu papel. Pôs-se linda, estampou um sorriso no rosto e assim passou a festa toda. Sem entusiasmo, mas com charme, ao mesmo tempo em que parentes da noiva e amigos de ambos estavam felicíssimos pela festa tão bonita e alegria do casal, porém já maculada pela tristeza da perda e ausência daquela pessoa tão especial.

Enquanto passavam na tela aquelas fotos comuns nesses eventos, víamos nelas a imagem tão viva e feliz do pai falecido e podíamos sentir que ele estava presente naquela comemoração dentro de cada um de nós que com ele conviveu.

Via-se estampado no rosto do comedido noivo um misto de felicidade e tristeza, arrisco também alguma culpa por não “poder” sentir-se tão feliz no seu dia enquanto a noiva era puro glamour e felicidade absoluta pelo seu dia de princesa. Que confusão de emoções! Mas um sonho não se dimensiona. As dores e a alegria também não. Atitudes certas ou erradas? Qual a medida das coisas?

Há pouco menos de um ano, a mãe de um amigo muito querido (ela também muito querida por todos os amigos dele) morreu após uma luta perdida contra um câncer. Enquanto acamada, ela dizia que queria uma cerveja. Falei que compraria uma sem álcool e ela me xingava, dizendo que isso não era cerveja. No dia do enterro eu falei: Agora eu vou beber aquela cerveja por você! Ainda no cemitério, o filho dela, meu amigo, muito triste, reuniu os amigos mais próximos e disse: “Vamos beber à véinha!!!” (como ele a chamava carinhosamente). E lá fomos nós para o bar, beber e brindá-la, e beber e brindá-la com alegria. O garçom achou que fosse brincadeira e meu amigo ameaçou mostra-lhe a certidão de óbito. Ela sabia do respeito que tínhamos por ela e ali estava ela em cada um de nós, tomando sua merecida cerveja.

Não sabemos o desfecho do nosso amanhã. Por mais que o planejemos, tudo pode mudar. Acho que precisamos aprender a ter desenvoltura e flexibilidade quando a circunstância pede e não julgar as atitudes do outro pelo nosso prisma, que é único, só nosso!

Quando a vida nos prega peças e surpresas que fogem ao nosso controle, é melhor observar o momento e aprender com ele para tentar entender que a medida das coisas é muito variável.

By Clarissa Porciuncula


Fonte: http://www.discutindoarelacao.com.br/?p=1992

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